quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Entrevista: Publicitário revela ao Dourados News bastidores do "enterro" do carro de Scarpa


O publicitário, Júnior Bottura, participou dos bastidores do "enterro" do carro de Scarpa - Foto: Eduarda Rosa

Eduarda Rosa
O entrevistado desta semana do Dourados News  é o publicitário, Júnior Bottura, 30 anos, que esteve na  cidade palestrando durante a X Sincom (Semana integrada de Comunicação) da Unigran. Ele trabalha no setor de atendimento da empresa Leo Burnett, uma das mais premiadas agências publicitárias brasileiras.
À reportagem ele contou sua experiência nos bastidores do enterro do carro de Chiquinho Scarpa, que era uma campanha de doação de órgãos, além de opinar sobre vários outros assuntos da área.
Confira a entrevista:

Dourados News: A campanha sobre a doação de órgãos com Chiquinho Scarpa, foi considerada em todas as redes sociais uma das melhores ‘tacadas de marketing’, como foi elaborada essa ideia de enterrar um Bentley no valor de 1,5 milhão?
Júnior Bottura: A agência tem um cliente há três anos que é a ABTO (Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos) e essa associação nos passou um briefing de uma campanha de doação de órgãos. E quando a gente passou para a equipe de criação, não tinha dinheiro, pois é uma associação que não tem fins lucrativos.
Em uma das primeiras postagens Chiquinho publica que decidiu enterrar seu Bentley ainda em vida, assim como faziam os faraós
DN - E como isso aconteceu?
JB - O objetivo era: vamos usar as redes sociais para de alguma forma divulgar isso e aí os meninos tiveram a brilhante ideia de chocar as pessoas de alguma forma. O que pode chocar uma pessoa? Um cara milionário falar que vai enterrar alguma coisa muito preciosa. E aí de uma lista de milionários brasileiros a gente chegou em um nome, e hoje eu acredito que essa campanha não teria dado certo com outra pessoa, foi pensado em Eike Batista, Narcisa, mas eu acho que não funcionaria com outra pessoa que não fosse o Chiquinho. Porque ele é muito maluco mesmo, ele abraçou a causa, foi muito parceiro.
DN - E a ideia?
JB - A ideia surgiu de um desafio de a gente tentar impactar as pessoas, chocar as pessoas nas redes sociais de uma forma diferente e não simplesmente criar uma campanha “normal”, que a gente já tinha feito e não tinha dado muito resultado. E o Chiquinho Scarpa me surpreendeu porque ele é louco mesmo, ele vive a vida, ajuda um monte de gente – de fato eu presenciei isso lá – mas ele é um cara surpreendente porque ele é bem resolvido “eu curto minha vida mesmo, eu sou um play boy mesmo!”.
Para dar mais veracidade à história eles eles fazem um buraco no jardim
D.N.: Como conseguiu chegar ao Chiquinho Scarpa?
J.B.: - Antes de apresentar para o cliente a proposta nós fomos atrás do Chiquinho Scarpa, porque a campanha só daria certo se ele aceitasse. Então eu consegui o telefone dele com a amiga da minha esposa. Passei três dias ligando para o celular dele 20 vezes por dia, do meu celular, até que uma hora ele foi vencido pelo cansaço e me atendeu – foi um choque para mim – ele disse “ o que você quer comigo? Porque você não para de me ligar?”. Aí eu falei: - Oi, Chiquinho. Meu nome é Junior, eu tenho um negócio muito legal para te apresentar, mas tem que ser ao vivo e você vai ter assinar um termo de sigilo, porque se você não gostar, não pode contar para ninguém.
DN - E ele?
J.B - Ele falou ‘então vem aqui na minha casa amanhã, às 3h da tarde, que eu vou te receber’. Então a gente foi na mansão no outro dia. Chegamos e mostramos a ideia para ele, alguns momentos de silêncio e ele disse: “todo mundo acha que eu sou louco, eu não devo nada para ninguém, vamos embora!”. Nesse momento poucas pessoas sabiam. Tínhamos que ter estratégias, com isso pensamos em pegar pessoas influentes que poderiam aceitar, pessoas tão malucas quanto ele: Danilo Gentili e Marcelo Tas. Como nós não sabíamos quanto tempo ia durar, procuramos uma empresa de assessoria de imprensa que treinou o Chiquinho com 50 possíveis perguntas que poderiam ser questionadas a ele em entrevistas.
Após um helicóptero sobrevoar a propriedade o pequeno buraco teve que ser aumentado
D.N.: Porque o Bentley?
J.B.: - O Bentley foi escolhido por ser o carro mais caro que ele tinha. Pois a notícia tinha que ser ‘é o carro de mais de um milhão de reais’.
D.N.:Como funcionou o processo das postagens?
J.B.: 1º Postagem - no domingo (15/09): Chiquinho: “Estou vendo um documentário sobre os faraós e achei muito interessante que eles enterram suas fortunas depois que eles morrem”.
2º Postagem - na Segunda-feira (16/09)– Chiquinho: “Decidi fazer como os faraós e vou enterrar meu Bentley ainda em vida”.
3º Postagem - na terça-feira (17/09)– Fizemos um pequeno buraco e aumentamos com o photoshop. Por que a ideia não era abrir um buraco de verdade.
DN - E Deu certo?
JB - Mas o que aconteceu? Meio-dia Scarpa me liga e fala “têm um helicóptero sobrevoando a minha casa há 40 minutos, não sei o que eu faço, não sei o que está acontecendo, será que pode ser alguma coisa?” Daí eu falei espere aí, quando liguei a televisão e fui passando de canal, quando cheguei na Record estava ao vivo no Balanço Geral e aí o cara falava, “o que será que o famoso vai enterrar no quintal?”
Um dia antes do "enterro"
DN - E ai? Vocês agiram como?
JB - Por sorte nós mandamos cedo uma lona para lá, porque a casa dele é uma mansão toda aberta. Então a gente fez a foto e tampo o local. Eles conseguiram ligar na casa do Chiquinho e ele iria entrar ao vivo na Record. A notícia se espalhou, nós não esperávamos que estivesse deste tamanho, já na terça-feira. Perguntamos para ele qual era o limite e Scarpa respondeu: “eu não devo nada para ninguém!”. Como aconteceu de a Record ir lá com o helicóptero nós pedimos para cavar um buraco de verdade e ele disse “acho ótimo!”. Conseguimos uma escavadeira e ele não cavou tudo, mas ficou uns 40 minutos ali, porque adorou a brincadeira.
DN - Prossiga?
JB - Na quinta-feira (19/09)- A postagem – Chiquinho: “Estou dando o último trato no Bentley e amanhã às 11h da manhã é o enterro.” Ele deu a senha do Facebook dele para nós da agência, as postagens eram feitas de lá. Nós fomos na casa dele uma vez por semana durante um mês, do dia que a gente falou com ele até o dia do 1º post foram três semanas.
No "enterro"
DN - E o dia do “enterro”?
JB - No dia tinham 53 pessoas de veículos diferentes para cobrir o funeral. Ás 10h45 a Veja São Paulo postou que havia hipótese do enterro do carro ser uma campanha publicitária de doação, pois até então nada tinha vazado. Com isso nós corremos para que as 11h em ponto fosse o “enterro”. No momento da revelação ele fala que todos estão achando um absurdo enterrar um carro, mas um absurdo mesmo é enterrar órgãos. A gente tinha medo das pessoas não gostarem da revelação, mas foi o contrário. Já tínhamos feito outras campanhas, mas essa era diferente, pois querendo ou não nós estamos contando uma história que não era real para um monte de jornalistas. No dia a gente não sabia qual seria a reação das pessoas.
D.N.: Quais foram os resultados?
J.B.: - Os post sobre doação de órgão teve 743% mais compartilhamentos do que a primeira postagem. Quase R$ 50 milhões em mídia espontânea.Um mês depois da revelação com o mesmo período do ano passado, houve aumento de 31,5% nas doações de órgãos. A doação de órgãos nunca foi tão comentada na história e assim nós provamos para o Brasil que nada é tão absurdo do que enterrar órgãos.
Após chamar a atenção da imprensa, Scarpa revela ser uma campanha de doação de órgãos
D.N.: Mudando de assunto, há quanto tempo é formado como publicitário e por que escolheu tal profissão?
J.B.: Eu me formei em 2004. Eu queria fazer psicologia, mas meu pai era contra, mas eu sempre tive vontade de trabalhar com alguma coisa que envolvesse comportamento humano e aí eu sempre gostei muito de assistir propagandas na televisão. E um dia, estava no primeiro colegial, estava lendo sobre as faculdades e peguei um livro da Metodista, que foi a faculdade que eu fiz. Sou publicitário, mas o curso que fiz foi comunicação mercadológica, promoção de vendas e merchandising, então era tudo que na época não era convencional.
D.N.: Os publicitários brasileiros são considerados mundialmente os mais criativos, o que você atribui a isso?
J.B.: Esse ano uma agência de São Paulo foi considerada a agência do ano em Cannes – que é o principal festival de publicidade – isso afirma o quanto o Brasil é criativo. Na verdade acho que o explica isso é o que é o Brasil essa diversidade de pessoas, de culturas, de natureza, tudo que o Brasil tem de diferente... faz com que o publicitário abra a mente, acho que o que faz o brasileiro ser mais criativo é a nossa cultura mesmo, nosso povo, de ter muitas influencias de muitos outros países.
Júnior Buttura durante palestra em Dourados - Foto: Eduarda Rosa
D.N.: Como você avalia o mercado publicitário no interior do Brasil?
J.B.: Eu tive a experiência de trabalhar dois anos fora de São Paulo e eu abri uma agência para fazer lançamento imobiliário, em 2007, e é muito complicado, acho que as pessoas que conseguem trabalhar com publicidade fora das grandes metrópoles são bastantes guerreiros, é um desafio muito grande. Eu comparo como futebol, todo mundo entende, todo mundo pode dar ‘pitaco’, as pessoas acham que é subjetivo, todo mundo tem opinião sobre ‘isso é bom, isso não é bom!’ e é difícil a gente mostrar que a gente estuda isso. Nós estudamos o comportamento das pessoas para pensar e para tentar passar de alguma forma uma mensagem de uma maneira efetiva. Mas é complicado, fora o dinheiro de publicidade é concentrado nas grandes cidades.
D.N.: Por que nas cidades de interior as pessoas, principalmente empresários, ainda tem resistência em contratar profissionais da comunicação (jornalistas, publicitários, webdesing)?
J.B.: Porque é muito mais fácil você ter alguém que você fale ‘faz desse jeito ou daquele’ do que ter alguém chato e dizendo ‘não é este o caminho, vamos por aquele outro!”, é por ser subjetivo.
D.N.: - Poderia fazer uma análise de como as agências do interior devem se portar diante do investimento menor que em grandes centros?
J.B.: É um desafio muito grande de se manter e principalmente de se manter fazendo coisas boas que você realmente acredita. Porque o que acontece muitas vezes no interior é que você acaba fazendo de tudo, você não consegue focar – como eu me foquei em mercado imobiliário – e quando veio a crise em 2008 a minha agência quebrou, porque eu não tinha diversificado. Então para você sobreviver no interior você tem que diversificar e eu vejo que as principais agências foras das metrópoles elas conseguem sobreviver tendo contas públicas (prefeituras, universidades), pois é muito difícil você manter uma agência do interior trabalhando só para empresas privadas.
D.N.: Aqui em Dourados tem uma lei que restringe divulgação com som em frente às lojas (poluição sonora), mas possuem carros de som para tal divulgação, isso é publicidade?
J.B.: No interior eu sempre uso isso como publicidade, tentar proibir isso sempre existiu, mas esse é um tipo de publicidade muito antiga. Eu acho que seria mais fácil as pessoas sentarem e tentarem estabelecer alguma regra, algum processo (cadastro, nível de decibéis regulado).
D.N.: Por que em algumas cidades as pessoas insistem em investir nesses carros, em vez de rádio, TV ou jornal?
J.B.: As pessoas que não tem o conhecimento da publicidade acabam se baseando pelo que elas acham e pelo que elas são impactadas. Elas não pensam quem é o público e se esse público esta sendo impactado. Por exemplo, neste caso, eu vi muitos carros circulando no centro, a pessoa passa o dia dela lá, o lojista está ali, então por ela estar sendo impactada o tempo todo ali ela acha que aquele é o caminho. E esquece que grande parte da população não fica ali o dia inteiro, mesmo quem passa não vai ouvir a mensagem que ela está colocando e que as vezes uma revista ou um jornal impacta a pessoa no momento em que a pessoa está lendo em um momento de descontração pode ser muito mais eficaz.

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