Distrito de Itahum já teve uma movimentada estação ferroviária - Foto: Ademir Almeida
Eduarda Rosa
O apito do trem traz mais do que passageiros movimentando a estação e cargas sendo carregas e descarregadas dos vagões, representa desenvolvimento para a região e melhora a economia local.
Itahum, distrito a 60 km de Dourados, hoje um pequeno vilarejo com cerca de 4 mil pessoas, área composta basicamente de fazendas, já vivenciou o trem apitando em sua janela todos os dias, por mais de quatro décadas.
O Dourados News foi até o distrito e mostrará em três matérias como era o local, que recebeu no final da década de 1940 uma estação; como ficou após a desativação; e o que beneficiará a região de Dourados com previsão de ser um entroncamento ferroviário, das estradas de ferro Norte-Sul e Ferroeste.
A estação na inauguração. O prédio era de madeira, diferente do atual de alvenaria - Acervo André de Bauru |
A Noroeste ligou o litoral paulista, em Santos, com as fronteiras do Brasil com a Bolívia e o Paraguai, assim também serviu como uma forma de aproximar as relações internacionais.
Uma testemunha da chegada da estrada de ferro a Itahum é o servidor estadual aposentado, Antônio Carlos Dagel, de 75, que foi morar com sua família na região em agosto de 1945, quando tinha apenas sete anos de idade.
Antônio Carlos Dagel - Foto: Ademir Almeida
“Quando mudamos para Itahum a ferrovia estava em construção, meu pai trabalhava como ferreiro e a gente sempre ia com ele nas obras. Eu estava lá no dia em que explodiram com dinamite uma pedra preta, foi por isso que deram o nome da estação de Itahum, pois em guarani quer dizer pedra preta. Estava lá também no dia da inauguração, muitas pessoas reunidas admirando o trem e o maquinista deu um apito forte – correu todo mundo – foi a primeira vez que vi o trem (risos)”, rememorou Dagel.
De acordo com o aposentado, o distrito era para se chamar de cidade de Eldorado, Itahum era o nome da estação, e na verdade a pronúncia correta é “Itarrum”, porque no guarani o H tem som de R.
A ferrovia foi feita por etapas e a cada parte concluída era inaugurada. A primeira foi de Sidrolândia, depois até Maracaju, Ministro Pestana, Itahum e finalizada em Ponta Porã, em 1953. Porém a história da Noroeste tem detalhes curiosos, afinal tudo aconteceu na época em que os “coronéis” da região “imperavam”.
Mapa da Ferrovia Noroeste
O proprietário da maioria das terras onde se situa o distrito era o colono Antônio Vicente Azambuja, que em 1914 chegou ao município de Dourados e fundou o vilarejo Eldorado, hoje Itahum, segundo a pesquisa intitulada “A Reforma Agrária e os impactos regionais: o auge, a decadência e a nova fase do distrito de Itahum”, desenvolvida pelo professor, Mauro Sérgio Almeida Lima, e a educadora, Dalva Marques Machado, ambos da Escola Estadual Antônio Vicente Azambuja,naquela região.
Azambuja, como dono de mais de 50 mil hectares de terras formou o vilarejo, que ele queria que crescesse e se tornasse uma cidade valorizada. Então deu um “jeito” para que a ferrovia passasse dentro de suas terras.
“Há um comentário de que na verdade esta estrada de ferro não era para passar por aqui. Mas as pessoas com dinheiro e influência política fizeram desviar o percurso, porque esta estrade de ferro era para sair de Maracaju, Vista Alegre e ir para Dourados. O engenheiro, 'doutor' Horta, fez toda a medição do patrimônio e mudou a rota da estrada para Ponta Porã, para fundar a cidade. Depois ele ficou morando em terras aqui da região”, contou Antônio Dagel.
Fundador do distrito - Foto: Ademir Almeida
Com a ferrovia o distrito virou referência na região, com um maior fluxo de pessoas e mercadorias, desde a construção no final da década de 1940 e início de 1950, que trouxe trabalhadores de diversas regiões do país.
“Com isso aumentou a circulação de pessoas e, consequentemente, a necessidade de suprimento das mesmas. Aliado a isso aconteceu a transformação do território do distrito, muita movimentação, bastante comercialização e fixação dos migrantes na região. Posteriormente, esses trabalhadores fixavam moradia no distrito, devido ao fato de ser vagarosa a construção das ferrovias, com seus obstáculos naturais da região e depender totalmente de verbas do Governo Federal”, disse o estudo dos pesquisadores.
O trem de passageiros começou a “correr” até Itahum, na época em que se iniciou o povoamento da Colônia Agrícola Nacional de Dourados (CAND), as pessoas vinham de São Paulo e desembarcavam em Itahum, de lá pegavam um ônibus para ir para Dourados ou Ponta Porã.
Mauro Sérgio Almeida Lima e Dalva Marques Machado - Foto: Ademir Almeida
“Porque não tinha acesso por São Paulo pelo Paraná, estrada não tinha, as saídas daqui eram só pela estrada de ferro. Dourados foi colonizada, pessoal antigo, veio pela ferrovia”.
A principal carga transportada nos vagões eram madeiras cerradas e toras, pois as madeiras da região de Dourados eram todas embarcadas ali. “Na época não existia agricultura no campo era mais gado, antes da colônia agrícola – nem se falava em lavoura - então o que era carregado no trem era lenha do cerrado”, contou Dagel.
Com toda esta movimentação, o pai do servidor público aposentado tinha cada vez mais certeza que ali era um local prospero para morar, “meu pai era descendente de russo e foi para lá um tempo, decidiu ficar aqui em Itahum, porque ele achava que onde tinha estrada de ferro, tinha progresso. Então deixou de ir para Dourados para ficar aqui”.
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Estação de Maracaju, em 1984 - Foto cedida por João Limeira/Reprodução: Ademir Almeida
Itahum era um corredor na época e as pessoas tinham facilidade para andar de trem, pois transitavam dois trens por dia – de manhã saia um de Campo Grande e outro de Itahum -, “a gente pegava um trem aqui, ia até Maracaju, descia, esperava o que vinha de Campo Grande, pegava e voltava no mesmo dia para passear”, falou o aposentado.
Segundo explicação do pesquisador Paulo Roberto Cimó Queiróz, após a inauguração e funcionamento da ferrovia em 1953, houve a movimentação e aquecimento maior do comércio local, pois a mesma servia para o escoamento da produção da erva mate, que em meados de 1950, significava 30% dos serviços prestados pela Ferrovia Noroeste do Brasil, devido aos extensos ervais que haviam na região do Sul do Estado de Mato Grosso do Sul e do país vizinho, o Paraguai.
Conforme Queiróz, o ramal, que partia de Presidente Prudente em São Paulo, foi desativado em 1988 e teve os trilhos arrancados. Em Itahum o trem de passageiros passou pela ultima vez em 1º de junho de 1996 e o último cargueiro em 2002.
Isto ocorreu porque a Rede Ferroviária Federal foi privatizada na década de 1990 e desde 2006 é administrada pela América Latina Logística. Com a desestatização, os trens de passageiros foram extintos da malha noroeste, pois a concessão previa apenas transporte de carga. Contudo poucas estações foram aproveitadas para este fim, e dentre elas não entrou o ramal de que vai até Ponta Porã.
Com a desativação da estrada de ferro, Itahum, a Eldorado dos sonhos de Antônio Vicente Azambuja, foi deixada por grande parte da população. Confira na reportagem de amanhã o depoimento de alguns moradores sobre como ficou o distrito, após a desativação da ferrovia.
Com a privatização da Rede Ferroviária Federal a estação de Itahum ficou abandonada - Foto: Ademir Almeida
http://www.douradosnews.com.br/dourados/nos-trilhos-do-desenvolvimento-o-auge-do-distrito-de-itahum
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