Lia Lima e seu marido Marcos - Foto: Eduarda Rosa
Eduarda Rosa
Dentre os mais de três mil deficientes visuais de Dourados está Lia Lima. Quando nasceu seus olhos viam tudo, mas por conta de uma doença, retinopatia, teve a perda gradativa da visão e há 13 anos não enxerga praticamente nada. Essa história tinha tudo para ser triste, mas Lia começou a “ver” um mundo diferente, a partir do momento em que perdeu a visão.
“Depois que eu perdi a visão a coisa ficou mais pé no chão, eu encarei a vida mais a sério, antes parecia que eu nem vivia, então essa perda me fez pensar mais na vida, a refletir, a ouvir um passarinho e falar ‘nossa que bonito’, pois quando eu tinha visão eu ouvia o passarinho, via o passarinho e pra mim era normal e hoje chego a parar para ouvir o seu canto”.
Lia fez sua graduação a distância, com a ajuda de um programa de computador que lê tudo que está na tela - Foto: Eduarda Rosa
Os valores da vida também mudaram, pois antigamente ela dava valor para coisas que hoje já não tem mais tanto sentido quanto antes. “Antes eu tinha tudo, via tudo e fazia tudo, mas as coisas não tinham tanta importância, nada valia nada, tudo que fazia era vazio e agora, mesmo sem visão, eu me sinto mais útil, e é incrível não é? Sinto-me mais útil do que quando via e fazia de tudo, mesmo dependo muito mais das pessoas”, reflete a publicitária.
Para sair da depressão procurou uma igreja evangélica e lá pode aflorar talentos que não conhecia, começou a cantar no louvor, dançar no grupo de coreografia e até a dirigir os cultos. Lá conheceu Marcos, com quem já está casada há dez anos.
“Quando ele me pediu em namoro achei que não ia dar em nada, porque para mim não existia mais o casamento, e eu não pensava que fosse tão bom quanto é. Então isso foi algo de Deus na minha vida mesmo, tanto é que meu esposo hoje ** é o meu olho**, se não fosse ele, não sei o que seria de mim”, disse a esposa.
Lia é a presidente da Associação Beneficente Life, de deficientes visuais de Dourados - Foto: Eduarda Rosa
Lia conta que não gosta de ficar parada, sem fazer nada, e com isso tenta mostrar para as outras pessoas também com deficiência que é possível fazer muita coisa “ás vezes a pessoa fica falando ‘ai eu não posso, ai eu não consigo’, mas eu digo ‘oh, espere aí, você pode sim! Você consegue, e basta ter força de vontade, basta ânimo, vamos conhecer os colegas, vamos conversar, vamos nos divertir’, por isso tivemos a ideia de criar a associação de deficientes visuais de Dourados, além de lutar pelos nossos direitos”.
Lia revela que o que sente mais falta é de dirigir, pois no volante se sentia livre, mas agradece a Deus por Ele ter “freado” sua vida, pois pisava fundo, e ia a 180 km/h, “mudou muito minha vida, hoje se falou em correr de carro eu nem entro dentro, Deus guardou a minha vida, porque já não era mais para eu estar aqui não! Naquelas loucuras que eu andava...” A “freada” em sua vida fez com que começasse a depender muito de outras pessoas, “é um exercício mutuo de paciência, principalmente para quem queria tanta liberdade!”, reflete Lia.
E por mais irônico que possa parecer ela tem certeza que a perda da visão foi um propósito de Deus para sua vida. “Porque só a gente para conhecer como a gente era, e eu me conhecendo, posso dizer que se eu perdesse as pernas, por exemplo, não iria parar, mas Deus conseguiu me parar de um jeito muito inteligente, me tirando a visão. Ele me colocou em uma posição que hoje eu posso ‘ver’ a vida, ver as pessoas, o meu filho, o meu pai e minha mãe, de uma forma diferente, ou seja, hoje ‘vejo sem ver’, e consigo sentir mais, pensar melhor no sentido da vida, porque antes isso não existia na minha vida, era um vazio”, comemora Lia Lima.
Publicado originalmente em: http://www.douradosnews.com.br/dourados/sensibilidade-e-bom-humor-para-ver-a-vida-mesmo-sem-enxerga-la
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